Seguiu uma alimentação baixa em FODMAPs e não resultou...porque será?

Embora poucas devam ser as pessoas que não sabem o que são os FODMAPs ou pelo menos ouviu falar dos ben(mal)ditos formadores de gás e retentores de água,  aqui fica uma definição antes de avançar com qualquer outro comentário.

Fodmap é a sigla que representa:
Fermentáveis (estes hidratos de carbono presentes em muitos alimentos e alguns aditivos alimentares não são facilmente absorvidos, ficando à mercê das nossas bactérias para produzirem o gás e reter água, que tantos sintomas traz (dores, diarreia, obstipação,...) em determinados casos.
Oligosacarídeos - Frutanos e Galacto-oligossacarídeos -trigo, centeio, cebola, alho, leguminosas,...
Dissacarídeos – Lactose – produtos lácteos.
Monosacarídeos – Frutose – mel, maçãs,...
Polióis – sorbitol e manitol – adoçantes artificiais mas existentes naturalmente em algumas frutas e legumes.


Num intestino completamente saudável também se dá fermentação, mas numa extensão que não causa desconforto nem sintomas.

A Universidade de Monash na Austrália tem uma vasta investigação sobre o tema e por isso, nos dias de hoje, já se começa o tratamento de muitas alterações intestinais (principalmente em casos de síndrome do intestino irritável) pela implementação de uma alimentação pobre nestes hidratos de carbono. É sempre uma boa forma de começar, se o processo for bem acompanhado, já que à fase de eliminação se sucede a fase de reintrodução e personalização. A descoberta de que alimentos e quanto se pode comer, pode ser demorada, mas também eficaz. 

Usamos também com muita frequência esta abordagem que é bem fundamentada, mas, “não há bela sem senão” e uma alimentação pobre em FODMAPs pode facilmente tornar-se uma alimentação inflamatória ou pouco equilibrada se for mal acompanhada. Basta dizer que o açúcar de mesa é pobre em FODMAP e batata frita também. Bem feita pode até diminuir marcadores inflamatórios. Mas, não é por aí que vamos hoje... terei todo o gosto em escrever sobre a dieta noutro post, porque levada a cabo correctamente tem muitos benefícios sim.

Embora haja muito sucesso, nem sempre uma alimentação pobre em FODMAP ajuda a eliminar o mal estar intestinal ou os sintomas voltam algum tempo depois e as causas podem ser diversas:

  • Não se começou ainda a lidar com o stress (não estou a dizer que a doença está na cabeça do paciente, mas sim que o stress é efectivamente (e sem volta a dar) um ponto a ser trabalhado; 

  • Existem expectativas pouco realistas e não se estava à espera que alguns sintomas não desaparecessem completamente (pode acontecer). Alguns sintomas aparecem de vez em quando, podem variar com o ciclo menstrual ou com o nível de stress a determinada altura, por exemplo;

  • Iniciou-se a alimentação quando já existia um estado de inflamação sistémica e a alimentação não está a ser suficiente para diminuir essa inflamação;  

- Fez-se demasiado tempo a fase de restrição, o que causou um crescimento excessivo de bactérias indesejáveis no intestino grosso, o que levou à volta dos mesmos sintomas ou sintomas diferentes. 

- O paciente ouviu falar de FODMAP mas achou muito complicado e fez apenas retirada de glúten e lácteos; 

- O sobrecrescimento bacteriano existente é no intestino delgado (SIBO - Small intestinal bacterial overgrowth)  e não no intestino grosso, pelo que a alimentação pobre em FODMAPS pode ser apenas uma parte do tratamento; 

- Existe alguma deficiência enzimática que não estava a ser levada em conta, o que faz com o processo digestivo continue a ser ineficaz mesmo numa alimentação pobre em FODMAP;

- Existe um parasita, vírus ou bactérias que devem ser erradicadas do intestino;
- Não se tem “alimentado as bactérias” com alimentos prebióticos ou é necessário um probiótico;
- As bactérias que estão a desequilibrar a flora intestinal estão em biofilmes que, por si só, são difíceis de erradicar,...

Ora aqui entra a maravilha da nutrição personalizada e nestes casos raramente se consegue fugir de fazer algumas análises (se fossemos transparentes tudo era mais simples). Uma boa avaliação pormenorizada às fezes e não só, permite descobrir:

  • Quais são as bactérias benéficas que estão em falta?

  • Que bactérias/parasitas/virus não deviam estar no intestino ou não em grandes quantidades?

  • Existe uma candida intestinal ou outro fungo?

  • Que ácidos gordos de cadeia curta estão a ser produzidos ou estão em falta?

  • Existem hidratos de carbono/proteínas/gorduras nas fezes?

  • Está a produzir-se IgA em quantidades adequadas?

  • Há SIBO ou não?

  • É SIBO mais formador de metano ou hidrogénio?

  • Como está o nível de elastase?

  • Já há alteração da permeabilidade intestinal e altos níveis de zonulina?


    Uma avaliação a algumas vitaminas e minerais também ajuda a melhor direccionar a alimentação e/ou suplementação. Está a comer vegan, vegetariano, paleo, come carne, come peixe?

    Tudo isto são pontos para além dos FODMAPS que fazem diferença na sua saúde/recuperação intestinal.

As respostas a estas perguntas e muitas outras, tornam o acompanhamento nutricional e/ou médico verdadeiramente personalizado e ajudam a guiar o tratamento para além dos FODMAPs.

Cada paciente é efetivamente único.

Escrito por Dra. Helena Santos. Pode consultar mais informação sobre a sua abordagem aqui.

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